Mercado amplia pressão sobre governo com dólar, Selic e “risco fiscal”

Vaivém de indicadores – que sinalizaria um cenário de “incertezas” – deixa o Copom à vontade para, sob a presidência do bolsonarista Roberto Campos Neto, pôr a política monetária ainda mais ao gosto do setor financeiro

Os nove membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) debatem, a partir desta terça-feira (5), o novo valor da Selic, a taxa básica de juros. Sob um clima de crescente pressão do mercado contra o governo Lula, a aposta dos investidores é numa alta de 0,5 ponto percentual no índice, que chegaria, assim, a 11,25% ao ano. O anúncio do Copom está previsto para esta quarta (6).

Enquanto não sai a Selic, a Faria Lima manda recados. Na sexta-feira (1), o alvo foi o dólar, que disparou a R$ 5,86 – maior cotação desde maio de 2020. Tudo por causa da “demora” do governo em anunciar um novo pacote fiscal restritivo, complementar ao arcabouço.

Lula pediu ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que cancelasse uma viagem já marcada para a Europa. Nesta segunda (4), para “acalmar” o mercado, Haddad disse que o governo está “pronto” para divulgar a “revisão” de gastos. Por revisão, entenda-se uma série de cortes.

Não deu outra: os agentes do mercado sorriram, a Bolsa subiu e o dólar fechou em baixa, a R$ 5,783. Parecia que o fantasma do “risco fiscal” estava momentaneamente contido.

Porém, o vaivém dos indicadores – que sinalizaria um cenário de “incertezas” – deixa o Copom à vontade para, sob a presidência do bolsonarista Roberto Campos Neto, pôr a política monetária ainda mais ao gosto do setor financeiro. Do outro lado, para um governo que se propõe à reconstrução do Brasil, a combinação é explosiva: juros elevados (e, ainda assim, em alta), dólar sem controle e possíveis cortes em áreas sociais.

Desde meados de outubro, Haddad tem exposto as diretrizes do “novo pacote” e afagado o mercado. “A Faria Lima está, com razão, preocupada com a dinâmica do gasto daqui para a frente. E é legítimo considerar isso com seriedade”, disse o ministro à Folha de S.Paulo. “E o governo tem que tomar providências. A Fazenda está com isso na mesa, 100%.”

Entre especulações e palpites, o governo já chegou a desmentir boatos sobre retrocessos no seguro-desemprego e na multa de rescisão do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Segundo o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, não há, em sua pasta, “debate sobre o fim da multa rescisória, pagamento ao trabalhador e à trabalhadora após a demissão, ou sobre a redução do FGTS”.

Nesta segunda (4), Marinho foi um dos ministros que participaram de reunião no Palácio do Planalto com Lula e Haddad – os outros foram Camilo Santana, da Educação, e Nísia Trindade, da Saúde. Apesar das expectativas, Lula teria preferido segurar qualquer anúncio.

De todo modo, a pressão do mercado não é razoável. Em 2023, o governo usou 43,23% do orçamento federal para pagar juros e amortizações da dívida pública, num gasto da ordem de quase R$ 1,9 trilhão. A Saúde respondeu por 3,69%; a Educação, por 2,97%; e o Trabalho, por apenas 2,19%. A mágica encomendada a Haddad seria mostrar por que três áreas, responsáveis, somadas, por 8,85% do orçamento, são mais preocupantes do que os juros, que sugam 43,23%.

Do ponto de vista econômico, esta pode ser uma semana decisiva para o governo Lula 3. Com um Banco Central independente – e rendido –, o presidente da República pouco pode fazer em relação à Selic. Mas as decisões sobre as prioridades da gestão federal ainda permanecem sob seu comando. A sorte está lançada para Lula.

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