Igreja e presidente atacam Marx

Dois ataques, de direções diferentes, foram disparados contra as idéias de Karl Marx neste final de 2007. No Vaticano, Bento XVI emitiu a Encíclica Spe Salvi, condenando o materialismo em geral e o marxismo em particular. Na América do Sul, o pre

Parodiando o Manifesto Comunista, duas conclusões decorrem desses fatos: 1º) O comunismo continua reconhecido como força; 2º) Continua sendo necessário aos comunistas expor, à face do mundo inteiro, seu modo de ver, seus fins e suas tendências.



O ataque mais consistente – embora pueril – partiu do cardeal Joseph Alois Ratzinger que, na época hitlerista, integrava a Juventude do Partido Nazista; na idade adulta, comandou a Congregação para a Doutrina da Fé (novo nome da Santa Inquisição); e, já na senilidade, foi ungido representante do Deus cristão urbi et orbi, assumindo o papado como Bento XVI. Na sua opinião, do ateísmo resultaram “as maiores crueldades e violações da justiça”.



O Sumo Pontífice, segundo divulgam seus seguidores, lê ou fala alemão, italiano, francês, latim, inglês, espanhol, grego antigo e hebraico e recebeu oito doutorados honoríficos em diferentes universidades. Ninguém o acusa de ignaro. Porém, para fazer sua pregação obscurantista, passa por cima do fato de que, na história da humanidade, os períodos de maiores injustiças e crueldades ocorreram sob o manto religioso – inclusive na Alemanha nazista de sua juventude.



Embora o título de sua encíclica signifique “Salvos pela esperança”, o chefe supremo dos clérigos confessa sua impotência: ''Precisamos fazer tudo o que podemos para superar o sofrimento, mas bani-lo do mundo não está em nosso poder, somente Deus é capaz de fazer isso''. O conteúdo do documento é baseado única e exclusivamente na fé – ameaça com o juízo final aos maus e acena com o “encontro com o Deus vivo” para os bons, bem de acordo com os preceitos fundamentalistas de seu credo.



Mas, quando sai do Reino dos Céus e desce à Terra, passa à calúnia pura e simples: ''Marx achou que uma vez solucionada a economia tudo seria resolvido. Seu erro foi o materialismo', escreve. Deturpação desavergonhada das idéias do fundador do socialismo científico. Em nenhum momento Marx afirmou que, uma vez solucionada a economia, tudo seria resolvido. Mas o genial alemão explicou ser necessário acabar com a sociedade baseada na exploração do homem pelo homem para se alcançar a justiça e a felicidade social e denunciou o papel das religiões, da ideologia e das armas propriamente ditas (do chicote aos arsenais bélicos) para manter a sociedade dividida entre uma minoria de exploradores e uma imensa maioria de explorados.



Sem peias na pena, o dirigente católico escreve que o “erro fundamental de Marx foi esquecer o homem e sua liberdade”. Ora, em verdade voz digo, o acerto fundamental de Marx foi indicar que a humanidade precisa se livrar dos preconceitos e da visão deturpada da realidade para alcançar a verdadeira liberdade – “a consciência da necessidade”, como escreveu o co-autor do Manifesto do Partido Comunista, Friedrich Engels.



Os seguidores do papa encarregados de divulgar a nova obra, cardeal Georges Cottier e o jesuíta Albert Vanhoye, revelaram que a encíclica anticomunista demonstra “a grande importância” que seu líder dá ao movimento operário. Este, de fato, é um dado importante. Bento XVI sabe que, sem o ópio religioso, é mais difícil para as classes dominantes manterem as amplas massas mansas como cordeiros diante de uma realidade que lhes é hostil. E a reafirmação deste entendimento é algo benfazejo neste início de século, quando a situação ainda de desarranjo das fileiras proletárias diante da ofensiva política, ideológica, econômica e militar do capital facilita que pululem ilusões quanto a não ser mais necessário desmascarar o obscurantismo.
Do outro lado do Atlântico, Lula não se conteve e, num ato em defesa da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, dia 5 de dezembro, cometeu seus vitupérios contra os que postulam a ação consciente na luta de classes proletária. Orgulhoso de ser iletrado e coerente com afirmações anteriores, quando professou nunca ter sido de esquerda, o presidente afirmou preferir ''ser considerado uma metamorfose ambulante” e não ter ''a dureza de um manifesto de partido comunista ortodoxo, em que tudo já está escrito”.



Talvez Lula nunca tenha lido o Manifesto. Se leu, não entendeu que nele NÂO está escrito tudo. Não entendeu que o marxismo é um instrumental para a análise da realidade e um guia para a ação. Nada menos dogmático – mas também nada menos capitulacionista diante da classe burguesa – do que estas palavras do Manifesto, que Marx e Engels escreveram há exatos 160 anos (fins de 1847): “Os comunistas lutam pelos interesses objetivos imediatos da classe operária; mas, ao mesmo tempo, representam e defendem também, dentro do movimento atual, o porvir desse movimento”.



É por isso que os comunistas, ortodoxamente, continuam a entoar, no século XXI, a Internacional: “Messias, Deus, chefes supremos, nada esperamos de nenhum! Sejamos nós que conquistemos a terra mãe livre e comum!“


 


Proletários de todo o mundo, uni-vos! Obscurantistas e semeadores de ilusões, tremei!

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