Paulo Nunes fala da obra e vida de H.Dobal

Em entrevista ao Portal Vermelho, o presidente do Conselho Estadual de Cultura, professor Manoel Paulo Nunes fala da obra do escritor piauiense, H. Dobal, que faleceu na última semana. Paulo Nunes destaca a opção por novos temas na poesia de H.Dobal, c

Vermelho – Qual o legado cultural da obra de H. Dobal para o Piauí e para o Brasil?



Paulo Nunes – Pela revolução temático-expressional que trouxe a poesia de H. Dobal à literatura piauiense, o seu legado à nossa cultura é dos mais significativos. Depois da contribuição valiosa que a geração de 1917, fundadora da Academia Piauiense de Letras, trouxe ao nosso Estado e à nossa literatura, especialmente através de poetas, como Da Costa e Silva, Celso Pinheiro, Martins Napoleão e outros mais, ninguém, antes dele, se distinguiria tanto na abertura de caminhos novos à poesia piauiense. Daí o seu legado representar para a nossa cultura, tanto a piauiense quanto a brasileira, a contribuição mais relevante à poesia entre nós, na segunda metade do século XX. Não representa ele assim uma glória de ocasião, mas uma presença definitiva em nosso Panteon literário.



Vermelho – Como o Senhor classifica a obra de H. Dobal dentro da história literária piauiense e brasileira?



Paulo Nunes – Dobal viveu a fase do pós-modernismo. Passada a agitação trazida pela Semana de Arte Moderna, a festa paulista de 22, que inaugurou o Modernismo em nossa história literária, a poesia de H. Dobal representa uma nova tomada de posição em termos de estética literária, ao incorporar ao seu fazer poético novas formas de expressão que não apenas aquelas do neo-parnasianismo da chamada geração de 45, com a adoção de formas de composição tradicional, como o soneto. Mas, ao lado disso, optar por novos temas – no caso, a dura realidade do viver cotidiano do homem piauiense, sofrido e abandonado – transformando o seu verso em algo mais trabalhado, criando assim novos modelos de expressão.



Vermelho – E como ser humano, quais as principais lições deixadas pelo escritor?



Paulo Nunes – Como ser humano era Hindemburgo Dobal pessoa de conduta irretocável. Irônico e divertido às vezes, como convinha a criatura tão inteligente e superior, era pessoa que se conduzia na vida com um sentido ético exemplar. Seja como servidor público, com larga folha de serviços prestados ao país, na área fazendária, em que exerceu os mais altos postos de direção, aposentado-se como presidente do Conselho de Contribuintes da Fazenda Pública Nacional, deixou ele admiráveis lições de vida. Correto, humano, íntegro e digno, soube assim granjear a simpatia de amigos e admiradores, que nele viam o amigo fraterno, o caráter adamantino, o pai e cidadão exemplar.



Vermelho – O que o Piauí deve fazer para preservar a obra literária deste escritor para que ela permaneça viva na vida cultural do Estado?



Paulo Nunes – Dado o valor de sua obra para o patrimônio cultural do povo piauiense, é dever do Estado responsabilizar-se por sua divulgação, a fim de que as novas gerações nele tenham um estímulo permanente para novas aquisições do saber e desenvolvimento do gosto literário e artístico.



Vermelho – Dentre as obras de H. Dobal, qual delas o Senhor considera que tenha valor universal?



Paulo Nunes – Acho a obra de H. Dobal em sua integralidade um monumento vivo de nossa cultura. À maneira do poeta grego Hesíodo, procurou ele retratar em sua poesia “os trabalhos e os dias” de nossa gente, inclusive em seus momentos mais dolorosos e sofridos, como ocorre com o seu poema épico “El Matador”, focalizando um episódio da gesta bárbara de nossa colonização, ou seja, o massacre da raça indígena, dizimada pelo colonizador. OU ainda quando retrata, na figura de Leonardo das Dores Castelo Branco, em seu poema épico “Leonardo”, de tão grande beleza, a saga de nossas lutas na guerra da Independência. Se pudesse optar ainda por alguns de seus livros, escolheríamos O Tempo Conseqüente, o seu livro de estréia, Os Signos & as Siglas, a sua obra elegíaca sobre Brasília, A Cidade Substituída, canto de amor à cidade de São Luis do Maranhão, ou um de seus livros de crônicas – Um Homem Particular. Dobal, como poeta e como pensador, é genialmente inabarcável. Ficará entre nós para sempre como o melhor momento de nossa alta poesia.



De Teresina,
Daiane Rufino