De Olho no Mundo, por Ana Prestes
Os ataques de Israel à Síria com o apoio dos EUA foram intensificados desde novembro e são o destaque da nota desta quarta-feira (13). A afirmação falsa do secretário de Estado Mike Pompeo sobre a proximidade da Al Qaeda com o Irã, a condução do segundo processo de impeachment de Trump, o pronunciamento do presidente francês Macron sobre a soja brasileira, as eleições presidenciais em Uganda, o enfrentamento entre grevistas e governo Modi na Índia, a reação das empresas de tecnologia depois da invasão do Capitólio e o novo protocolo para os passageiros que embarcam rumo aos EUA são outros assuntos analisados pela cientista política Ana Prestes.
Publicado 13/01/2021 14:32 | Editado 13/01/2021 14:38
Uma notícia que escapou aqui destas Notas nesse início de 2021 foi a dos ataques militares de Israel à Síria. Na verdade, Israel tem feito ataques mais sistemáticos na Síria desde novembro de 2020, mais especificamente nas Colinas de Golã (região disputada desde a guerra dos seis dias de 1967) que ficam na periferia de Damasco. A alegação dos israelenses tem sido que o Irã vem minando com explosivos as bases militares israelenses nessa região, mas o que israelenses buscam de fato é diminuir a influência iraniana no país. Neste começo de ano, os ataques voltaram e naquele 6 de janeiro em que estávamos com o foco no que vinha ocorrendo nos EUA com a invasão no Capitólio, os israelenses atacaram novamente Damasco por via aérea em alvos que dizem ser iranianos. Nas últimas horas os ataques recomeçaram, segundo a agência de notícias SANA, nas cidades de Deir el-Zour, Mayadeen e Boukamal, na proximidade da fronteira com o Iraque. Há notícias de pelo menos 18 ataques e 23 pessoas mortas. A agência de notícias Al Jazeera fala em mais de 30 mortes. As agências falam também do apoio dos EUA aos ataques e de um encontro entre o secretário de Estado Mike Pompeo e Yossi Cohen, do Mossad, em Washington na última segunda (11).
Por falar em Pompeo e Oriente Médio, ontem (12) Pompeo chocou a comunidade internacional ao dizer que a Al Qaeda “encontrou um novo lar no Irã”, para alegar que agora os EUA não tem outra opção a não ser “lidar com a situação”. O chanceler iraniano, Javad Zarif, contestou Pompeo no twitter e disse que se tratam de “mentiras beligerantes”. A acusação de Pompeo é vista como mais uma de uma sequência de manobras agressivas feitas por Trump e Pompeo contra seus inimigos faltando poucos dias para deixarem a Casa Branca. Analistas e especialistas nos conflitos do Oriente Médio dizem que nunca houve prova de nenhuma aproximação entre o Irã e a Al Qaeda, muito pelo contrário, o Irã xiita e a Al-Qaeda sunita seriam historicamente inimigos sectários.
O Congresso Americano está dedicado esta semana ao tratamento que o legislativo vai dispensar ao presidente Trump uma semana após a invasão do Capitólio. Ontem (12) pela noite, os congressistas votaram um apelo oficial para que o vice-presidente Mike Pence use a 25ª emenda para afastar Trump por incapacidade de se manter no exercício de suas funções. A votação ficou em 223 a 205 a favor da carta. Pence recebeu a carta, mas não acedeu ao pedido. Ele alegou não acreditar que esta ação (uso da 25ª emenda) fosse “pelo melhor interesse de nossa nação”. Virada essa página, pode começar hoje o quarto processo de impeachment presidencial da história dos EUA, sendo o segundo com Trump. A grande questão que paira é sobre qual o sentido de se fazer um impeachment contra um presidente que deixará seu cargo em 7 dias. As respostas a esta questão serão ouvidas na sessão de hoje. Outra questão posta é sobre a adesão de republicanos ao pedido. Alguns republicanos já anunciaram que vão votar pelo impeachment, entre eles, a deputada Liz Cheney e os deputados John Katko e Adam Kinzinger. Uma fala do senador Mitch McConnell favorável à retirada de Trump da presidência também chamou atenção e apontou para possíveis apoios imprevistos vindo dos republicanos. O voto do senador Mitt Romney também é visto como certo. Embora o processo possa tramitar rápido na Câmara dos Representantes, no Senado ele só tramitaria após Trump deixar de ser presidente. Há uma controvérsia jurídica sobre se o Senado pode tocar o impeachment de um civil. Uma vez aprovado o impeachment, abre-se a possibilidade de uma votação para impedimento de que Trump concorra a qualquer cargo político no futuro. Há uma pequena probabilidade de um impeachment expresso no Senado, desde que os senadores adiantem o início da sessão prevista para 19 de janeiro e não haja objeção de nenhum senador/a à aceleração do processo.
Ontem (12) falei aqui nas Notas sobre um encontro de 50 países, organizado pelo presidente francês Macron para tratar de temas ambientais e mudanças climáticas. Nesse encontro falou-se muito em interromper a “importação de desmatamento”. Após o encontro, o presidente francês se pronunciou diretamente sobre o Brasil e publicou um vídeo em suas redes sociais sobre o desenvolvimento de uma “soja europeia”. Nas palavras de Macron, “continuar a depender da soja brasileira seria o mesmo que apoiar o desmatamento da Amazônia”. O comportamento de Macron revela que ele encontrou um inimigo externo perfeito, o presidente Bolsonaro. Isso tem ajudado ele a recuperar apoio interno, principalmente entre os produtores franceses conhecidos por seu protecionismo. Que o Brasil de Bolsonaro destrói o meio ambiente e ampliou o desmatamento é fato, mas que Macron está tirando dividendos políticos disso também é fato.
Acontecem amanhã (14) eleições presidenciais em Uganda. Cerca de 18 milhões de eleitores vão escolher o presidente que governará pelos próximos cinco anos. A campanha foi marcada por episódios de violência e repressão policial. Observadores internacionais tiveram dificuldade para se credenciar para acompanhar o pleito. Nestes dias prévios à eleição foram suspensos os acessos a todas as redes sociais no país, do Twitter ao WhatsApp. Disputam a eleição o atual presidente, Yoweri Museveni (há 35 anos no poder) pelo NRM – Movimento Resistência Nacional e outros 10 candidatos. Entre estes, o que mais se destacou na oposição foi Robert Kyagulanyi, cantor muito popular no país e conhecido por seu nome artístico Bobi Wine. Ele disputada pela Plataforma de Unidade Nacional. Em um dos episódios mais violentos da campanha, que ocorre desde novembro, 54 pessoas foram mortas por forças policiais durante um ato de campanha de Bobi Wine.
O enfrentamento entre os trabalhadores rurais da Índia e o governo Modi ganhou novos contornos nos últimos dias. Há três meses os trabalhadores vêm realizando greves e marchas massivas, consistentes e persistentes contra a Nova Lei de Agricultura. Agora, o pronunciamento e ação do presidente da Suprema Corte do país, Sharad Bobde, trouxe novidades. Nas palavras do juiz, o tribunal estava “desapontado com a maneira como o governo lidou com tudo isso”. No entanto, o que o tribunal propôs tampouco agradou os trabalhadores do campo representados por mais de 400 sindicatos de todo o país. A suprema corte suspendeu a aplicação das leis que geraram os protestos e estabeleceu um comitê de especialistas para ajudar nas negociações entre governo e trabalhadores. Ocorre que estão no comitê formuladores das leis rejeitadas pelos trabalhadores. Um agricultor de Punjab, entrevistado por agência de notícias indiana (NDTV) disse: “nós não aceitamos esse comitê, pois todos os membros do comitê têm sido pró-governo e têm justificado as leis”. Eles acreditam que a criação do comitê é uma forma de diversionismo do governo junto à corte e que não aceitam nada menos que a revogação das leis.
Após Trump ter sua conta no Twitter desligada em definitivo e ter tido suas contas suspensas no Facebook, YouTube e Instagram, outras ações que visam diminuir seu poder de influência tem sido tomadas, como a desativação da rede Parler, a suspensão de 70 mil contas do twitter identificadas como ligadas ao grupo QAnon e o bloqueio à realização de doações políticas de grandes corporações como a Microsoft, Google, JPMorgan e outras até Trump. Esse processo fez com que ficassem mais conhecidas outras plataformas como a Rumble, uma versão do YouTube usada por grupos de direita, o MeWe, alternativo ao Facebook, e aplicativos como o Telegram e o Signal.
A partir de 26 de janeiro, todos os passageiros que quiserem entrar nos EUA deverão apresentar resultado negativo para teste de coronavírus feito três dias antes da viagem. A regulamentação foi feita pelo CDC (centro de controle de doenças do país) e divulgada ontem (12). Será aceito também um documento que comprove que a pessoa se recuperou da Covid19. A decisão veio ainda com uma recomendação de que a pessoa ingressante no país volte a realizar o teste 3 a 5 dias após a chegada aos EUA e permaneça isolada por 7 dias após a viagem. As companhias aéreas podem negar embarque caso o teste não seja apresentado. Por enquanto, essa informação é indiferente para brasileiros, pois viajantes provenientes do Brasil atualmente não podem ingressar nos EUA.