Petrobras está regulada contra seu acionista majoritário, a União

A engenheira Magda Chambriard considera inadmissível a estatal vir a público ameaçar desabastecimento, como já fez, e também exigir que o acionista majoritário tenha que pedir autorização para o minoritário para fazer o que precisa ser feito. “Esse estatuto precisa ser revisto”.

Foto: Agência Sindical

A engenheira Magda Chambriard mostrou no Seminário “O Desmonte do Setor de Energia – Petrobras e Eletrobras – e os Caminhos para a sua Reconstrução” como a empresa estatal Petrobras tem sido gradualmente regulada para impedir a atuação da União, sua acionista majoritária, na definição de suas estratégias de gestão.

O seminário foi promovido pela Fundação Maurício Grabois, através da Cátedra Claudio Campos. O debate aprofundou o tema da crise do setor energético e os desafios para a sua recuperação.

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O Brasil é o 9º. maior produtor de petróleo do mundo, o 8º. maior consumidor, mas um país que consome per capita menos energia que a média mundial. São 4,5 vezes menos que os EUA e 2,5 vezes menos que a Alemanha, o que revela a distância do Brasil dos países mais desenvolvidos.

O Brasil tem 46% de energia renovável, enquanto 83% dos países do mundo ainda mantém alto percentual de matriz energética oriunda de combustíveis fósseis e apenas 13% de energia renovável. Um esforço imenso, com apoio da Petrobras, para chegar a esse percentual, afirmou Magda Chambriard.

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Com a pandemia e a guerra na Ucrânia, os questionamentos sobre a necessidade de manter essas estatais e suas cadeias produtivas revelaram uma resposta clara. A Petrobras se mostra um ativo estratégico para o desenvolvimento nacional pela exploração e refino de derivados de petróleo.

O Brasil produz pouco mais de 3 milhões de barris de derivados e importa 600 mil barris por dia, um quinto de todo derivado que o país consome.

Magda mostra que o Brasil exporta parte de seu petróleo bruto, mas paga por uma logística complicada de exportação. Com as refinarias ociosas, o diesel, derivado mais utilizado, já representa importação de 25% do consumo, num momento de alta contínua de preços. Isso impacta na inflação, pois “a cesta básica anda sobre rodas” a diesel, com acentuada dependência internacional.

A especialista observa que, desde 2016, o governo desonerou a estatal de abastecer o país, instaurou o regime de paridade de preços internacionais (PPI), enquanto os executivos da empresa se sentem “homens de negócios” desobrigados da preocupação com as necessidades do país que garante a sobrevivência da empresa. Hoje, a imprensa especializada se alarma quando a Petrobras passa mais de 50 dias sem reajustar preços. Mas num passado não tão longínquo, os reajustes aconteciam em meses e anos. 

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“Estamos praticando preços internacionais por conta de 25% de importações de diesel, quando 75% de derivados como esse são refinados no país. O pior é que esse preço internacional é aplicado num diesel que não envolve transporte e seguro, por exemplo, porque já está internalizado”, explica. A engenheira considera fundamental refutar essa PPI que precisaria de outra forma para não assombrar o consumidor brasileito.

Ao analisar o estatuto interno da empresa, reformado em 2018, ela destaca que os acionistas minoritários ganharam poderes contra a atuação governamental, que passa a ficar restrita à cobertura de prejuízos. Ela questiona porque não se inverte a visão para lucro, considerando que a atuação no pré-sal é uma vantagem competitiva e não é quantificada como benefício. 

Quando se fala em aumentar o intervalo de reajustes, imediatamente se grita prejuízo ao acionista. “No frigir dos ovos, quantificando e fazendo o encontro de contas entre prejuízos e benefícios, o governo brasileiro e a sociedade como um todo já removeram da frente da Petrobras diversos empecilhos ao seu crescimento e garantiram que essa empresa crescesse e atacasse todo os desafios que ela enfrentou ao longo de seis décadas”, afirma. 

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Magda considera inadmissível a estatal ameaçar desabastecimento, como já fez, e também exigir que o acionista majoritário tenha que pedir autorização para o minoritário para fazer o que precisa ser feito. “Esse estatuto precisa ser revisto”.

Magda Chambriard é engenheira civil, formada pela UFRJ, mestre em engenharia química pela Coppe/UFRJ e tem especialização em engenharia de petróleo pela Petrobras, onde atuou por 22 anos. Também exerceu diversos cargos na Agencia Nacional do Petróleo, onde atuou até 2016, inclusive como diretora geral. Tem atuado também na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro como consultora.

Assista a exposição de 18 minutos de Magda, abaixo, a partir de 54 minutos:

Seminário

O caso da Eletrobras será tematizado, especificamente, no seminário da próxima segunda-feira (30), quando serão reunidos elementos sobre a situação da empresa, para organizar a defesa durante a campanha e sua reconstrução posterior.

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As exposições sobre o setor elétrico serão feitas pelos engenheiros Roberto D’Araújo, Íkaro Chaves e Ildo Sauer, dos economistas Aurélio Valporto e Clarice Ferraz, e do médico Sergio Siqueira da Cruz.

Além de conhecedores da real situação dessas duas empresas, os pesquisadores tiveram a experiência de dirigir ou trabalhar nelas ou na agência reguladora (caso da Petrobras).

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