Especialistas pedem protagonismo da juventude em defesa do Meio Ambiente

Enfrentar as mudanças climáticas deve ser pauta central do movimento estudantil, acreditam especialistas

Debate Juventudes pelo clima, em defesa da Amazônia e do Meio Ambiente dentro da Universidade. Foto: Yuri Salvador

O agravamento da crise ambiental e a emergência da mudança climática, que ameaçam a existência da vida no planeta, pautaram a discussão de uma das atividades da manhã desta quinta-feira (13), na Universidade de Brasília (UnB), dentro da programação do 59º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE). O evento, considerado o maior encontro de estudantes da América Latina, ocorre até domingo (16) na capital federal.

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Diretor do Observatório do Clima, uma rede de dezenas de organizações da sociedade civil, Márcio Astrini destacou que a “mudança climática é uma fábrica de gerar pobreza e de agravar a desigualdade social” no Brasil e no mundo. Astrini foi um dos convidados da mesa “Juventude pelo clima: em defesa da Amazônia e do Meio Ambiente dentro das Universidades”. Projeções da ciência, segundo o pesquisador, apontam que os efeitos da crise vão gerar mais de 280 mil mortes por ano, em todo o planeta, devido justamente às mudanças climáticas em curso. São mortes evitáveis, mas que recairão sobre a parcela mais empobrecida das populações em diferentes regiões.

“A situação mais cruel é que essas pessoas são as que vão mais pagar a conta do clima são as que menos contribuíram para o problema. Esses que mais contribuíram que moram nos países ricos e industrializados, e têm como se proteger”, observou. Mais do que uma questão de estatística sobre disponibilidade de carbono, o debate sobre mudanças climáticas, argumentou Astrini, é um problema social. “Um problema, por exemplo, das pessoas no Nordeste que vão enfrentar aumento da incidência de zika, dengue e chikungunya, por causa do maior período de sobrevivência dos mosquitos. Sabemos que são doenças que atingem os mais pobres”.

Protagonismo da juventude

“Todo o movimento social que se preze, inclusive o movimento estudantil, precisa entender urgentemente a centralidade da pauta ambiental e a hierarquia das mudanças climáticas”, defendeu o ex-líder estudantil, o deputado estadual por São Paulo, Guilherme Cortez (PSOL). Ele cobrou envolvimento real da juventude, por meio do movimento estudantil, nesse debate. “As organizações devem formular sua política no contexto de estarmos vivendo a maior crise e ameaça à existência humana”.

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Cortez ressaltou que é preciso evitar acusar a humanidade, de forma genérica, como responsável pela crise ambiental, porque isso esconde os verdadeiros e maiores responsáveis. “A saída não está em pequenas mudanças individuais de costumes, como reduzir o tempo de banho. Os responsáveis são uma minoria, são bilionários que estão dispostos a tudo para manter sua rentabilide”, criticou.

A ex-presidenta da UNE, Carina Vitral, também defendeu o protagonismo do movimento estudantil na discussão ambiental. “O movimento estudantil também precisa ser o movimento social de luta pelo clima”, pontuou. Fazendo referência ao tema da mesa, Vitral destacou o papel “essencial do investimento público na Ciência e Tecnologia” para alavancar uma transição ambiental e tecnológica que o Brasil precisa fazer.

Ex-presidente da UNE, Carina Vitral. Foto: Yuri Salvador

Nós por nós

Preservar os biomas brasileiros, especialmente a Floresta Amazônica, só vai ser possível se tiver participação central de quem vive na região, e diretamente nos territórios afetados. É o que defendeu o deputado federal Dorinaldo Malafaia (PDT-AP).

“Pensar a Amazônia sem perguntar ao povo da Amazônia como as coisas funcionam, não cabe”, afirmou o parlamentar amapaense, que defendeu uma “amazonização” do país, como forma de incorporar a pauta da defesa ambiental. Para ele, o momento de resgate da esperança com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve servir para avançar nessa perspectiva.

Na mesma linha, a historiadora Beatriz Calheiros de Abreu Evanovick, superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Amazonas, falou em “descolonizar” a Amazônia, que ainda é tratada com inferioridade pelo restante do país.

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“Nós ainda somos tratados como colônia, porque a gente é tratada de forma exótica, exuberante, de forma mítica. E, acima de tudo, como se a gente estivesse esperando um plano mirabolante para nos salvar. E não estamos esperando alguém nos salvar. Estamos ativos, pujantes. Nos interessa a Amazônia viva”, afirmou, ao denunciar também a falta de recursos e investimentos em ciência para garantir a autonomia de quem vive na floresta.

Plano de transição

Atualmente atuando como assessora especial no Ministério da Fazenda, Carina Vitral, que é economista de formação, afirmou que o governo federal prepara um ambicioso plano de transformação ecológica do país, que envolve 6 eixos principais. “O governo brasileiro está convencido que precisamos de um novo ciclo de políticas públicas que visem a mitigação, a adaptação e o desenvolvimento sustentável”.

Entre os eixos do projeto, estão ações estratégicas em finanças sustentáveis, para fazer com que recursos do governo e da iniciativa privada sejam canalizados para manter a floresta de pé, e não em atividades de degradação. O plano também quer avançar no desenvolvimento tecnológico para que o Brasil não passe a ser apenas exportador “de vento e sol”, mas que crie uma indústria verde de verdade, compatível com a natureza e capaz de gerar riqueza para a população.

O eixo de bioeconomia, segundo Carina Vitral, vai focar em expandir atividades produtivas sustentáveis, sobretudo na Amazônia. “Não queremos manter a floresta de pé com o povo da floresta passando fome. Não pode ser a madeireira e o garimpo ilegal que gerem emprego na Amazônia”, afirmou. Ela citou, como exemplo, a indústria de fármacos e outros segmentos que podem ser desenvolvidos em harmonia com o meio ambiente. 

Apesar de ter uma matriz elétrica considerada limpa, o Brasil ainda tem grandes desafios de transição energética em termos de uso de combustíveis fósseis no setor de transporte, destacou Carina. A economista ainda citou projetos de infraestrutura para adaptar as cidades e prevenir contra catástrofes ambientais que afetam a população.

Na mesma linha Dorinaldo Malafaia (PDT-AP) fez questão de lembrar que a Amazônia possui uma imensa população, atualmente superior a 25 milhões de habitantes, e o governo precisa investir em ações para conter a crescente favelização e garantir acesso à água e saneamento básico. “Não dá pra avançar do ponto de vista da favelização. Precisamos respeitar o povo da Amazônia.

Márcio Astrini, do Observatório do Clima, também demonstrou otimismo com o futuro do país, que pode liderar a agenda ambiental em todo o planeta. “É a primeira vez na história que temos um PR que fala abertamente sobre a questão do clima e se coloca em defesa das populações da Amazônia”.

Pedro Rafael Vilela é jornalista