Lula no Jornal Nacional

Em 2006, na entrevista com Lula, o roteiro de Bonner foi preso a um samba de uma nota só: Mensalão, a pauta criada e divulgada pelo imaculado Roberto Jefferson, a corrupção culpa de Lula

Ex-presidente Lula em entrevista ao Jornal Nacional durante as eleições de 2002 | Foto: Reordução/Globo

Escrevo antes da entrevista de Lula no Jornal Nacional.

O futuro, que acontece hoje daqui a pouco, merece umas linhas escritas com a experiência. Recordar é um modo de prever.

Quando Lula se despediu da presidência no Recife, para a televisão, Rede Globo à frente, Lula chorou, chorou e chorou por três vezes na noite de 28 de dezembro. Ou mais precisamente isto, no Bom Dia Brasil, que se”inspira” (copia e cola) o JN da véspera quando não o antecede: “O presidente Lula voltou a chorar em mais uma despedida pública, desta vez em Pernambuco…”. Chorão, chorão à toa, insinuou-se dizer.

Ou de modo mais preciso: em 2006, na entrevista com Lula, o roteiro de Bonner foi preso a um samba de uma nota só: Mensalão, a pauta criada e divulgada pelo imaculado Roberto Jefferson, a corrupção culpa de Lula.

“William Bonner: Candidato, o Ministério Público denunciou o que ele chamou de uma quadrilha de 40 integrantes, que teria como núcleo central, nas palavras do procurador, o seu ex-ministro chefe da Casa Civil, José Dirceu e dirigentes do PT, José Genuíno, Silvio Pereira, Delúbio Soares. Segundo a denúncia, eu vou ler um trechinho, os objetivos deles, desse núcleo eram: desviar recursos de órgãos públicos e de estatais para pagar dívidas do PT antigas e novas despesas. Tanto da campanha do PT quanto de partidos aliados. E ainda, segundo o procurador. O objetivo deles era garantir que o PT continuasse no poder comprando o apoio de outros partidos, numa referência ao mensalão. Candidato, diante de uma acusação tão dura quanto essa, que parte de um órgão politicamente independente. Como fica a questão ética, uma bandeira, um carro-chefe das suas campanhas eleitorais…

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William Bonner: Só uma observação, candidato. No caso específico do mensalão, esse escândalo da corrupção, na verdade o governo não denunciou nada, a denúncia partiu lá depois daquele escândalo nos Correios e mais tarde com as revelações, as denúncias do ex-deputado Roberto Jefferson. Mas a pergunta que eu queria fazer ao senhor diz respeito à traição. O senhor disse que a todos os brasileiros nesse caso que foi traído, mas até hoje o senhor não disse quem foi que traiu o senhor, não deu os nomes dos traidores. Num outro momento, por outro lado, o senhor manifestou solidariedade abertamente a ex-deputados petistas e a ex-ministros seus. Antes de se tornar presidente, a memória que o Brasil tem candidato, era de alguém que veementemente cobrava punição para quem quer que aparecesse diante de uma câmera de televisão suspeito de alguma coisa, mesmo que as culpas não tivessem sido provadas ainda. O que foi que fez o senhor mudar tanto de comportamento?

Lula: Primeiro você deve estar falando de outra pessoa. Eu nunca pedi para que alguém fosse condenado antes de se provar a sua culpa”.

Ex-Presidente Lula em entrevista ao Jornal Nacional | Foto: Reprodução/Globo

Mas vale a pena ver o comportamento geral do JN em relação ao governo Lula. Nos limites deste artigo, a rápida passagem tem que fazer escala no episódio mais repugnante e sujo da história de um jornal na televisão: a tragédia do avião da TAM em São Paulo em 2007.

Ali, o Jornal Nacional deu um show de teledramaturgia. Aliás, o sonho da emissora é ser Hollywood nos trópicos, cinematográfica que é em todos os programas. O gênero de telenovela há muito invadiu o seu jornalismo. Em dúvida, vejam por favor qualquer peça, qualquer joia do Jornal Nacional. Os títulos para a desgraça foram um primor de folhetim: “O maior desastre da aviação brasileira … Duas tragédias em dez meses… Tristeza e indignação na madrugada em São Paulo… A aflição das famílias das vítimas em Porto Alegre… O medo de quem mora próximo a Congonhas”. Em qualquer desses capítulos de telenovela, que eram mostrados como breves documentários, como autênticos momentos-verdade, havia um conjunto de imagens espetaculares: fogo, choro, convulsões, desespero, reconstituições por recursos de computador, que misturados à narração do… repórter …. eram uma aula, uma lição de dirigir, insuflar emoção nas… reportagens. Lágrimas, choros, prantos, fotos de crianças mortas, de jovens sem vida no vigor dos seus anos:

“O abraço solidário na hora da dor. Em Congonhas, parentes buscam informações. São momentos de desespero e angústia pra quem nunca imaginou estar tão perto de uma tragédia.

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Carmen Elisabete perdeu as filhas Júlia e Maria Isabel, e a mãe, que viajava de férias com as netas. ‘Minha mãe era apaixonada por elas, fazia tudo por elas’, chora a professora. Outra mãe perde as forças ao saber que os filhos de 12 e 17 anos nunca mais chegariam.

Depois da confirmação dos nomes, os parentes das vítimas enfrentam o doloroso calvário da identificação dos corpos: 86 pessoas foram trazidas para um hotel em São Paulo, onde recebem assistência médica e psicológica. Boa parte veio de avião de Porto Alegre trazendo documentos, fotos, fichas médicas e histórias daqueles que perderam…

É por causa da insegurança aérea que a tia de Michele, outra vítima, manda um recado. ‘Para que as autoridades tomem vergonha na cara e comecem a fazer alguma coisa pra esse país ir pra frente’, diz a advogada Sônia Miranda Vieira”.

Agora, hoje, depois de produzir o monstro fascista que está na presidência, o Jornal Nacional vai mudar o tom. Está em jogo a sobrevivência da emissora sob o indivíduo Bolsonaro. Logo mais. Para Bolsonaro, este dia 24 de agosto lembrará o dia do suicídio de Getúlio Vargas. Para usar uma imagem política, é claro.

Mas para Lula, hoje pode ser o dia da sua volta por cima. Depois da prisão mais injusta, infame, depois de perseguições e calúnias, Lula pode cantar com Noite Ilustrada o samba “Volta por cima”

Boa noite.

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