Solução de paz global no Médio Oriente?

Conforme noticiamos na semana passada, uma paz é acenada no Líbano. Um novo presidente tomou posse, após seis meses de vazio de poder. Israel, por intermédio da Turquia, acena em devolver aos sírios as estratégicas colinas de Golã. O Hezbolláh volta ao go

(Foto: Acordo de Paz
de Doha,
no Catar
com o
Hezbolláh)


 


Tudo se relaciona


 


Todos sabem de minhas convicções marxistas, materialistas dialéticas. Pauto minhas análises da realidade concreta, levando em conta forças políticas, classes sociais, correlação de forças entre os atores de uma determinada contenda. Nada esta isolado, tudo se relaciona. A semana que passou, os jornais estamparam manchetes que, para um estudioso da cena do oriente Médio – e pessimista, diga-se de passagem – e estas foram do tipo: “Governo e Hezbolláh fazem acordo no Líbano” (1); “Após oito anos de impasse, Israel e Síria confirmam retomada das negociações” (2); “Israel e Síria anunciam negociações de paz” (3); “Nó libanês depende de paz Síria-Israel” (4); “Para acordo, Israel quer que Síria rompa com o Irã” (5); “Esperança e presságio em Doha” (6) e “Líbano elege presidente após vácuo de meses” (7). Além de todas essas notícias, ainda nesta semana o jornal mais influente de Israel, o Haaretz, noticia um possível acordo de troca de prisioneiros israelenses de posse do Hezbolláh por guerrilheiros desse partido presos por Israel.


 


O que tudo isso tem a ver na atual conjuntura? E os acordos de paz com o palestinos, vão ocorrer mesmo até o final do ano, quando termina o mandato do presidente George W. Bush? Israel devolve Golã aos sírios? Em troca do que mesmo? O general Michel Suleiman vai conseguir conciliar facções tão antagônicas no Líbano e presidir mesmo o seu país?


 


Desdobramentos e perspectivas


 


Já falei aqui das dificuldades em fazermos análises internacionais. As chances de erros são grandes. As coisas mudam muito rapidamente, em especial no Médio Oriente (chamado de Próximo para os europeus). Mas, aqui arrisco alguns palpites.


 


É claro que todo esse processo esta relacionado. Quando comentamos a visita do ex-presidente Jimmy Carter à Palestina e sua contribuição ao processo de paz, pedindo o reconhecimento do Hamas e do Hezbolláh, isso fazia parte de um contexto de alteração das forças no cenário internacional. Não que estejamos, nós do campo mais avançado, progressista, dos que lutam por um mundo melhor, achando que já viramos a mesa, ganhamos o jogo. Ainda não. Mas as mudanças vêm ocorrendo e são visíveis. Não podemos dizer ainda que já estejamos no campo do ataque e que a derrota do inimigo esta no horizonte. Mas ele tem sentido o golpe e precisa distensionar.


 


Nesse sentido, o desgaste de Israel em manter a colonização de Golã cresce a cada dia. Não só é dispendioso manter essas colinas, mas há um desgaste político, pelo fato que tecnicamente o país mantém-se em “guerra” com a vizinha Síria há 60 anos. É preciso paz no Oriente. O acordo que o Hezbolláh aceitou fazer com o campo mais centrista do Líbano, tem a ver com esse contexto. Passar de cinco para onze ministros no governo, não só é positivo para auxiliar e prestar serviços ao povo libanês, como passam a ater poder de veto nas decisões governamentais (tudo indica que o primeiro Ministro Fouad Siniora, sunita e chefe de uma coalizão simpática ao Ocidente e à Israel).


 


Não creio que isso trará a paz ao Líbano. Não trará. O acordo assinado garante completa autonomia ao Partido de Deus (Hezbolláh) no que tange à sua rede de comunicação própria. Menciona o fato de que todas as disputas políticas nunca poderão ser resolvidas pela força das armas. Mas, preserva todo o arsenal militar do grupo. Tais acordos serão respeitados? E quando o governo sinalizar para uma linha mais moderada, de capitulação aos interesses israelenses e americanos, entregando a soberania libanesa? Quanto à governabilidade de Suleiman, ele será sempre um equilibrista, mas será cobrado e colocado em cheque o tempo todo. Poderá romper o equilibro em algum momento e terá que assumir posições mais firmes e decisivas, pois a vida vai cobrar isso dele. Os sírios são e serão sempre amigos, sem falar nos que tem a concepção de que o Líbano, síria e até a palestina seriam um e somente um país. Mas esse é um assunto polêmico que ficará para outra coluna.


 


Quanto à devolução de Golã aos sírios, isso poderá ser possível. Mas duvido que a Síria aceite romper com o Hezbolláh em troca disso. Nunca percebi nenhuma tendência nesse sentido e sei que o governo sírio seguirá mantendo relações políticas com todos os grupos de resistência e de luta pela libertação da Palestina e do próprio Líbano da influência nefasta do Ocidente nesse país árabe.


 


Por fim, a troca de prisioneiros entre Israel e o Hezbolláh. Também aqui vejo grandes chances de ocorrer. É um jogo de forças e de poder. Os Estados Unidos pressionam para que a troca não ocorra, pois não admitem negociação com os grupos que consideram “terroristas”, como o Hamas e o Hezbolláh. Não é o que pensa a sociedade israelense que pressiona o governo a realizar a troca de prisioneiros. Pelo que vimos na imprensa, serão devolvidos dois soldados israelenses e serão soltos cinco dirigentes do Hezbolláh. Aliás, diga-se de passagem, a ONU não classifica como “terroristas” nem o Hezbolláh nem o Hamas e nem menos as próprias FARC aqui na América do Sul.


 


Sobre a paz? Sigo descrente. Nem no Líbano, nem na fronteira síria, nem na Palestina. Não estão dadas ainda as condições e nosso acúmulo de forças ainda é suficiente para arrancarmos um acordo que faça a verdadeira justiça história aos povos que sofrem a opressão do imperialismo e seus apaniguados. Mas, nosso dia chegará e venceremos a batalha.


 


Grande evento no Clube Homs


 


Estive no Clube Homs nesta segunda, dia 26 de maio, pontualmente às 19h, para uma série de debates, exposição e folclore árabe. Era para não deixar passar em brancas nuvens os 60 anos da Nakba, que em árabe quer dizer “Catástrofe”, em uma alusão ao estabelecimento do Estado de Israel em 15 de maio de 1948 há 60 anos. Ouvimos o deputado federal Aldo Rebelo e o embaixador Carrillo, combativo e intelectual vigoroso, fazerem uma defesa firme dos palestinos. Assistimos ao filme Sanaud (que em árabe quer dizer “voltaremos”), relatando uma visita de deputados, sindicalistas e lideranças estudantis e populares ao Líbano e a Yasser Arafat em 1980. Assistimos a uma apresentação em Power Point da história dos palestinos no Brasil e de suas entidades representativas. Ouvimos o amigo e Prof. Paulo Daniel Farah, da USP, fazer uma exposição sobre poesia palestina de combate. Por fim, assistimos a uma bela apresentação de música árabe e dança árabe pela bailarina Amyra El Khalili e uma magnífica exposição do cartunista Latuf, que, com sua pena afiada, combate Israel e o sionismo com o papel e sua caneta nanquim. Quero de público parabenizar ao camarada Emir Mourad, secretário-geral da Federação das Entidades Palestinas que tão bem conduziu o ato, amplo e unitário, que contou com a presença de cerca de cem pessoas, incluindo o camarada Jamil Murad, ex-deputado federal, da amiga Soraya Smaili, do Instituto de Cultura Árabe, Eduardo Elias, da FEARAB/SP, do ex-deputado Airton Soares, do companheiro Milton do Movimento Negro Unificado e de tantas outras entidades que acabei não conseguindo registrar. Parabéns Emir e que eventos desses ocorram com mais freqüência, para nos aproximarmos cada vez mais, unirmos nossas forças contra o inimigo poderoso, mas não invencível.


 


Coluna “300”


 


Nada a ver comparar os famosos trezentos de Esparta com o número de minha coluna desta semana. Mas, quero compartilhar com nossos leitores que esta coluna desta quinta dia 29 de maio é a 300ª que escrevo em quase 6,5 anos em que tenho a honra de ser colunista do Portal Vermelho, ganhador, aliás, do IBest! De Melhor Página de Política na Internet. Foram 300 semanas, com apenas umas cinco ou seis que deixei de publicar uma análise sempre atualizada dos fatos e da política do Oriente Médio. Agradeço em especial à camarada Eliana Ada Gasparini, secretária da redação do Portal, pela paciência por ter me aturado esses anos todos e pela sua dedicação ao trabalho tão bem realizado. Agradeço aos que me acompanharam e apoiaram o trabalho nesse tempo todo e em especial aos que publicam, reproduzem e circulam minhas colunas em boletins, sites e revistas do Brasil e de muitos países. A todos o meu muito obrigado, esperando poder seguir contando com a confiança e o respeito de tod@s. Obrigado e abraços fraternais.


 


(1) Estadão, 22 de maio de 2008, página A13;


(2) Estadão, 22 de maio de 2008, A12;


(3) Folha, 22 de maio de 2008, página A12;


(4) Folha, 22 de maio de 2008, página A13;


(5) Folha, 23 de maio de 2008, página A13;


(6) Estadão, artigo de Rami Khouri, Caderno Aliás, página J7;


(7) Folha, 26 de maio de 2008, página A12.

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