STF retoma debate sobre criação do Juiz das Garantias no processo penal
Com esse novo papel no processo, o Juiz de garantias resolveria um problema processual do sistema penal brasileiro, que mantém o sistema inquisitório que o mesmo juiz que investiga, julga, evitando assim o juizado parcial no julgamento.
Publicado 10/08/2023 15:10 | Editado 11/08/2023 11:58
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira (9), o julgamento sobre alterações no Código do Processo Penal (CPP), entre eles, o processo que discute a constitucionalidade da criação do Juiz das Garantias no poder judiciário brasileiro.
O placar da votação está em 2 votos a 1 pela implantação do Juiz das Garantias. O julgamento foi suspenso nesta quinta-feira (10) e volta na próxima sessão, quarta-feira (16).
O tema é de extrema relevância para o sistema judicial. O juiz seria responsável por fiscalizar a legalidade da investigação criminal, autorizando medidas como prisões, quebras de sigilo e mandados de busca e apreensão, escuta telefônica, interrogatórios. Tem a função de garantir os direitos individuais dos investigados.
Na prática, coloca-se duas figuras ao longo do processo, pois o Juiz das Garantias realizaria um trabalho restrito à fase de instrução do processo, enquanto outro julgaria o processo legal.
Com essa iniciativa, o Juiz das Garantias resolveria um problema processual do sistema penal brasileiro, que mantém o sistema inquisitório com o mesmo juiz que investiga e julga. O Juiz das Garantias evitaria o juízo parcial no processo.
O assunto foi colocado em pauta há três anos, desde 2020. Porém, hoje, a polêmica em torno do assunto encontra opiniões diversas, principalmente, pela experiência negativa dos processos inquisitórios.
A última sessão que discutiu o tema foi paralisada no final de junho, depois do voto do relator, ministro Luiz Fux votar contra a implantação obrigatória do Juiz das Garantias. Na ocasião, o ministro Dias Toffoli pediu vista, ou seja, mais tempo para análise do caso.
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As ações contra o Juiz das Garantias foram propostas pelos partidos PSL (hoje União Brasil), Podemos e Cidadania, além de entidades de carreiras jurídicas.
Para magistrados que são favoráveis à instituição de outro juiz, esse novo papel no processo colaboraria com um sistema mais justo. Essa é a opinião do advogado, doutor em Direito Processual Penal e professor titular da PUCRS, Aury Lopes Jr que defende a introdução do novo juiz.
Para ele, a implementação do Juiz das Garantias no processo contribuiria para que o Brasil possa reescrever o Processo Penal de forma igualitária e imparcial. Seria a virada da “página horrenda” de processo inquisitório, autoritário e sem nenhuma qualidade de prova em que o país sofreu nos últimos tempos, observa o estudioso.
Segundo Lopes Jr, o Juiz das Garantias seria responsável (civil, penal e administrativamente) pelo controle de legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário (reserva de Jurisdição).
Assim, o Juiz das Garantias atuará na fase de investigação e recebimento da acusação, enquanto na fase de avaliação, o Juiz de Julgamento não se contaminaria pelo produzido na fase anterior, já que somente as provas, medidas de obtenção de provas e antecipação de provas seriam encaminhados.
Aury Lopes Jr conclui que a criação do Juiz das Garantias, acabaria com o uso manipulado de declarações da fase de investigação, porque só vale o produzido oralmente perante o Juiz de Julgamento.
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“Trata-se de um pleito por nós defendido há décadas – da exclusão física dos autos do inquérito – que finalmente é recepcionada. Só assim estará assegurada a distinção entre atos de investigação e atos de prova e, por consequência, efetivado o direito de ser julgado com base em ´prova´, produzida em contraditório judicial”, escreveu o magistrado em artigo publicado no Conjur.
Em entrevista, o advogado Lopes Jr disse que esse é “o momento de virar a folha e reescrever um novo Processo Penal, onde você tenha realmente igualdade cognitiva, um juiz imparcial, e um processo justo.”
Ministro Dias Toffoli: instituição do juiz de garantias é opção legítima
Único a se manifestar em sessão nesta quarta-feira (9), o ministro Dias Toffoli considera legítima a opção legislativa de incluir esse regramento no sistema penal. Segundo ele, como a regra é de processo penal, não há violação do poder de auto-organização dos tribunais, pois apenas a União tem competência para propor a instituição desse tipo de alteração.
O ministro considera que o sistema deve ser implementado de maneira obrigatória e nacional, mas propôs um prazo de 12 meses para que sejam adotadas medidas legislativas e administrativas para adequar as leis de organização judiciária dos estados, do Distrito Federal e dos Tribunais Regionais Federais. Em seu entendimento, essas medidas devem ser elaboradas conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A sessão que retomou a discussão do caso contou com a primeira participação do ministro Cristiano Zanin no plenário da Corte que tomou posse no dia 3/8. No primeiro voto proferido após a posse no STF, Zanin defendeu a implantação no prazo de um ano e afirmou que a efetivação do mecanismo vai mudar o rumo da Justiça brasileira para garantir julgamentos imparciais.
“Estou convicto de que a existência do juiz de garantias poderá, efetivamente, mudar o rumo da Justiça brasileira, pois, ao garantir à população brasileira maior probabilidade de julgamentos imparciais e independentes, permite-se que o sistema penal seja potencialmente mais justo. A imparcialidade do juiz é o princípio supremo do processo penal”, disse o ministro.
Zanin também destacou que o mecanismo vai ajudar no combate a injustiças raciais no sistema penal. “Há cerca de 650 mil pessoas presas no país. O encarceramento atinge majoritariamente jovens de até 29 anos, negros, com baixo grau de escolaridade”.
Faltam agora mais nove ministros para fazerem a apresentação em sessão de como votam, a presidenta Rosa Weber, Roberto Barroso, Cármem Lúcia, Edson Fachin, pelo menos quatro deles já indicaram que são a favor da implementação do Juiz das Garantias: Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André Mendonça. Em maio, Mendes defendeu a reorganização do Judiciário para evitar deturpações como vistas na Lava Jato, com parcerias entre o MP e juízes.
Com agências
*Matéria atualizada às 10h50 do dia 11/08/2023