STF retoma debate sobre criação do Juiz das Garantias no processo penal

Com esse novo papel no processo, o Juiz de garantias resolveria um problema processual do sistema penal brasileiro, que mantém o sistema inquisitório que o mesmo juiz que investiga, julga, evitando assim o juizado parcial no julgamento.

Sessão do Supremo em 202. Foto: Carlos Moura

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira (9), o julgamento sobre alterações no Código do Processo Penal (CPP), entre eles, o processo que discute a constitucionalidade da criação do Juiz das Garantias no poder judiciário brasileiro.

O placar da votação está em 2 votos a 1 pela implantação do Juiz das Garantias. O julgamento foi suspenso nesta quinta-feira (10) e volta na próxima sessão, quarta-feira (16).

O tema é de extrema relevância para o sistema judicial. O juiz seria responsável por fiscalizar a legalidade da investigação criminal, autorizando medidas como prisões, quebras de sigilo e mandados de busca e apreensão, escuta telefônica, interrogatórios. Tem a função de garantir os direitos individuais dos investigados.

Na prática, coloca-se duas figuras ao longo do processo, pois o Juiz das Garantias realizaria um trabalho restrito à fase de instrução do processo, enquanto outro julgaria o processo legal.

Com essa iniciativa, o Juiz das Garantias resolveria um problema processual do sistema penal brasileiro, que mantém o sistema inquisitório com o mesmo juiz que investiga e julga. O Juiz das Garantias evitaria o juízo parcial no processo.

O assunto foi colocado em pauta há três anos, desde 2020. Porém, hoje, a polêmica em torno do assunto encontra opiniões diversas, principalmente, pela experiência negativa dos processos inquisitórios.

A última sessão que discutiu o tema foi paralisada no final de junho, depois do voto do relator, ministro Luiz Fux votar contra a implantação obrigatória do Juiz das Garantias. Na ocasião, o ministro Dias Toffoli pediu vista, ou seja, mais tempo para análise do caso.

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As ações contra o Juiz das Garantias foram propostas pelos partidos PSL (hoje União Brasil), Podemos e Cidadania, além de entidades de carreiras jurídicas.

Para magistrados que são favoráveis à instituição de outro juiz, esse novo papel no processo colaboraria com um sistema mais justo. Essa é a opinião do advogado, doutor em Direito Processual Penal e professor titular da PUCRS, Aury Lopes Jr que defende a introdução do novo juiz.

Para ele, a implementação do Juiz das Garantias no processo contribuiria para que o Brasil possa reescrever o Processo Penal de forma igualitária e imparcial. Seria a virada da “página horrenda” de processo inquisitório, autoritário e sem nenhuma qualidade de prova em que o país sofreu nos últimos tempos, observa o estudioso.

Segundo Lopes Jr,  o Juiz das Garantias seria responsável (civil, penal e administrativamente) pelo controle de legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário (reserva de Jurisdição).

Assim, o Juiz das Garantias atuará na fase de investigação e recebimento da acusação, enquanto na fase de avaliação, o Juiz de Julgamento não se contaminaria pelo produzido na fase anterior, já que somente as provas, medidas de obtenção de provas e antecipação de provas seriam encaminhados.

Aury Lopes Jr conclui que a criação do Juiz das Garantias, acabaria com o uso manipulado de declarações da fase de investigação, porque só vale o produzido oralmente perante o Juiz de Julgamento.

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“Trata-se de um pleito por nós defendido há décadas – da exclusão física dos autos do inquérito – que finalmente é recepcionada. Só assim estará assegurada a distinção entre atos de investigação e atos de prova e, por consequência, efetivado o direito de ser julgado com base em ´prova´, produzida em contraditório judicial”, escreveu o magistrado em artigo publicado no Conjur.

Em entrevista, o advogado Lopes Jr disse que esse é “o momento de virar a folha e reescrever um novo Processo Penal, onde você tenha realmente igualdade cognitiva, um juiz imparcial, e um processo justo.”  

Ministro Dias Toffoli: instituição do juiz de garantias é opção legítima

Único a se manifestar em sessão nesta quarta-feira (9), o ministro Dias Toffoli considera legítima a opção legislativa de incluir esse regramento no sistema penal. Segundo ele, como a regra é de processo penal, não há violação do poder de auto-organização dos tribunais, pois apenas a União tem competência para propor a instituição desse tipo de alteração.

O ministro considera que o sistema deve ser implementado de maneira obrigatória e nacional, mas propôs um prazo de 12 meses para que sejam adotadas medidas legislativas e administrativas para adequar as leis de organização judiciária dos estados, do Distrito Federal e dos Tribunais Regionais Federais. Em seu entendimento, essas medidas devem ser elaboradas conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Cristiano Zanin participa de primeira sessão no plenário do STF como ministro da Corte. Foto: Supremo Tribunal Federal STF

A sessão que retomou a discussão do caso contou com a primeira participação do ministro Cristiano Zanin no plenário da Corte que tomou posse no dia 3/8. No primeiro voto proferido após a posse no STF, Zanin defendeu a implantação no prazo de um ano e afirmou que a efetivação do mecanismo vai mudar o rumo da Justiça brasileira para garantir julgamentos imparciais.

“Estou convicto de que a existência do juiz de garantias poderá, efetivamente, mudar o rumo da Justiça brasileira, pois, ao garantir à população brasileira maior probabilidade de julgamentos imparciais e independentes, permite-se que o sistema penal seja potencialmente mais justo. A imparcialidade do juiz é o princípio supremo do processo penal”, disse o ministro.

Zanin também destacou que o mecanismo vai ajudar no combate a injustiças raciais no sistema penal. “Há cerca de 650 mil pessoas presas no país. O encarceramento atinge majoritariamente jovens de até 29 anos, negros, com baixo grau de escolaridade”.

Faltam agora mais nove ministros para fazerem a apresentação em sessão de como votam, a presidenta Rosa Weber, Roberto Barroso, Cármem Lúcia, Edson Fachin, pelo menos quatro deles já indicaram que são a favor da implementação do Juiz das Garantias: Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André Mendonça. Em maio, Mendes defendeu a reorganização do Judiciário para evitar deturpações como vistas na Lava Jato, com parcerias entre o MP e juízes. 

Com agências

*Matéria atualizada às 10h50 do dia 11/08/2023

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