Forças Armadas não podem arbitrar em conflitos entre Poderes, assegura AGU

Instituição ressalta que deve ser afastada “qualquer interpretação que desborde dos princípios fundantes da democracia constitucional, especialmente o da separação dos
Poderes”.

Foto: Exército Brasileiro.

Em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (4), a Advocacia-Geral da União (AGU) assegura que as Forças Armadas não tem poder moderador, ou seja, não podem arbitrar em conflitos entre Poderes da República. Segundo o órgão, deve ser rejeitada qualquer interpretação que confira aos militares a atribuição de moderar ou arbitrar conflitos entre Poderes.

O órgão é responsável pela defesa judicial do Estado Federal, isto é, representa os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, bem como também é responsável pela orientação jurídica do Poder Executivo.

Na análise, a instituição manifesta que “pensar de maneira diversa seria admitir a existência de um Poder Moderador, o que não se sustenta à luz do arcabouço constitucional vigente”, aponta.

Em outro trecho, a AGU destaca que deve ser afastada “qualquer interpretação que desborde dos princípios fundantes da democracia constitucional, especialmente o da separação dos Poderes, de sorte que o comando das Forças Armadas pelo Presidente da República não possa resultar na intervenção de um Poder sobre o outro”.

A posição foi apresentada no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 6457) movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) no Supremo Tribunal Federal (STF) em maio de 2020 para que a Corte delimitasse o alcance das normas jurídicas que tratam da destinação constitucional das Forças Armadas (artigo 142 da Constituição Federal e dispositivos da Lei Complementar 97/1999).

Para o partido, era necessário naquele momento em que a Corte explicitasse o papel das Forças Armadas nos procedimentos previstos nos artigos 34, 136 e 137 da Constituição Federal (intervenção, estado de defesa e estado de sítio).

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Em junho do mesmo ano, o vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux deferiu a ação, expressando que a chefia das Forças Armadas tem poder limitado, “excluindo-se qualquer interpretação que permita sua utilização para indevidas intromissões no independente funcionamento dos outros Poderes, relacionando-se a autoridade sobre as Forças Armadas às competências materiais atribuídas pela Constituição ao presidente da República”.

Luiz Fux também frisou que a prerrogativa do presidente da República de autorizar o emprego das Forças Armadas, por iniciativa própria ou em atendimento a pedido manifestado por quaisquer dos outros poderes constitucionais, não pode ser exercida contra os próprios Poderes entre si.

A ação tinha a finalidade de repelir a inconstitucionalidade do uso das Forças Armadas na garantia dos Poderes constitucionais, pois na época, o então presidente Jair Bolsonaro assinalava que tinha Poder Supremo e que se apropriaria das Forças Armadas.

O caso se tornou evidente quando, em reunião ministerial, em maio de 2020, o então presidente tinha dito, falsamente, que o artigo 142 da Constituição poderia ser convocado por ele, caso precisasse intervir no poder judiciário. Diante disso, bolsonaristas utilizaram deste instrumento para alimentar investidas golpistas.

“Nós queremos fazer cumprir o artigo 142 da Constituição. Todo mundo quer fazer cumprir o artigo 142 da Constituição. E, havendo necessidade, qualquer dos Poderes pode, né? Pedir às Forças Armadas que intervenham para restabelecer a ordem no Brasil”, disse Bolsonaro na reunião.

Durante o seu governo, Bolsonaro e seus seguidores, recorreram inúmeras vezes a este artigo da Constituição para tentar justificar a ideia de que existe possibilidade constitucional de intervenção militar.

Em outro momento, em março de 2021, Bolsonaro disse em transmissão ao vivo pelas redes sociais que ele era ‘chefe supremo das Forças Armadas’ e ameaçou: é ‘fácil impor ditadura’ no Brasil.

No dia de hoje, 5 de outubro de 2023, exalta-se os 35 anos da promulgação da Constituição Federal de 1988. E é sob a vigência dessa Carta Magna que os brasileiros e brasileiras devem proteger. Dessa forma, é importante ressaltar que nesta Constituição não há qualquer referência que um Poder possa exercer domínio sobre o outro.

Apenas no Brasil do império, o Poder Moderador era previsto na Constituição de 1824, e funcionava como mediador entres os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário).

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